Não, não fui parar em um hospital, em nenhuma clínica psiquiátrica ou nada do tipo. Não precisei ser internada às pressas por nenhuma razão. Não perdi totalmente a minha saúde física ou surtei ao ponto de perder totalmente a cabeça. Contudo, eu fui um quase nisso também. Já fui um quase em várias coisas na vida, sejam elas boas ou ruins, e esse não é o foco deste texto (quem sabe um dia eu não aborde em um outro), não é mesmo? Neste caso, o que quero dizer aqui é agradeci e continuo agradecendo muito a quem quer que esteja por aí cuidando de mim (pode ser Deus, pode ser meu Anjo da Guarda, pode ser o Universo, pode ser o destino, ou simplesmente os sinais que a vida dá) por me fazer ter percebido antes que fosse tarde demais.
Não sei ao certo quando meu esgotamento
começou, todavia posso citar vários momentos onde o senti presente. Tem gente
que vai dizer que não sei lidar com os problemas da vida, que faço parte da
geração “mimizenta”, ou que sou frágil demais. Eu diria que é justamente o
contrário. Lido bem demais com os problemas, mas não lido bem com pequenas
coisas. Faço parte da geração “mimizenta”, mas tenho muito mais comportamentos questionáveis
da geração anterior que se mata pelo trabalho. Não sou frágil demais, mas
absorvo muito o que é do outro e esqueço de cuidar de mim. Como encontrar o
equilíbrio? É isso que eu venho tentando desde que notei que a minha vida
não tem mais espaço para mim, apenas para a minha carreira, para as minhas
amigas, para a minha mãe, para as pessoas que considero que precisam de ajuda,
para os padrões sociais aceitos, para os papéis que tenho que cumprir, para os
boletos que tenho que pagar e para as expectativas que criam em cima de mim.
Tá, e quando eu entro em cena? Pois bem, nunca.
A questão é que, quando você se dá conta, você não sabe o porquê:
- Não tem horário na sua agenda para incluir um novo compromisso;
- O seu cabelo tem ficado cada vez mais ralo e você nem se recorda a última vez que foi no salão para se dar um pequeno luxo (se é que você pode fazer isso);
- A sua fatura do cartão de crédito desenvolveu a síndrome do Buzz Lightyear;
- Você não se lembra qual foi a última vez que saiu para fazer algo que gosta;
- O seu vestido favorito já não te serve mais;
- A sua maquiagem favorita venceu dentro da gaveta;
- Foi aniversário de um antigo amigo e ele não te convidou, porém você nem teve tempo de processar isso e já é Natal de novo;
- Nem passa pela sua cabeça qual foi a última vez que você teve um date;
- Você comprou uma roupa que você nem sequer gosta;
- Você não se recorda há quantos meses têm que você não faz a unha do pé;
- Você ainda tem esperança de receber uma certa ligação e ela nunca dá as caras;
- Você apenas lembra que tem que marcar horário em algum lugar quando alguém te lembra disso;
- Você teve que parar aquele curso que você gosta;
- Você parou de absorver o conteúdo de alguns eventos que participa;
- O seu tempo de uso do Spotify caiu para 1% do que era antes;
- Você não sabe quais os filmes em cartaz ou as últimas séries lançadas pela Netflix;
- Você esquece em qual mês você está, porque sempre está preocupada com o que tem para fazer na semana seguinte.
Será que você entrou no piloto automático
ou apenas se perdeu no meio da rotina que criou e da vida que (in)conscientemente
você escolheu ter? E como você tem se sentido no meio disso tudo? Os seus
sentimentos se tornaram banais ou você passou a achar que também não tem tempo
para lidar com eles? É intenso demais? É pesado demais? É cansativo demais? Pedir
ajuda seria uma opção por achar que as coisas podem melhorar ou um sinal de que
você é muito fraca e não consegue resolver seus B.Os sozinha?
Foi assim que eu comecei a me sentir. Em
2021, eu dava conta de tudo (ou achava que dava e a conta chegou apenas hoje).
Eram três projetos de extensão, era monitoria, era voluntariado, eram as aulas
da graduação, eram os artigos que eu escrevia, era o TCC, era meu namoro, era
meu estágio, era o dinheiro que eu juntava para fazer meu intercâmbio no ano
seguinte. De repente, o ritmo começou a ficar puxado e os pratinhos começaram a
cair. O desespero começou. Tentei salvar todos e por um tempo, até consegui. Porém,
qual era o preço? No início, achava que era culpa da pandemia já que ela deixou
todo mundo meio biruta das ideias. Assim que ela “terminou” (se é que posso
dizer isso dessa forma), as coisas não voltaram ao “normal”.
O ano tinha virado e já era 2022. O namoro
terminou, deixei o estágio que consegui numa multinacional e entrei dentro de
um avião que me deixou a exatos 10 mil quilômetros de distância de tudo que eu
conhecia. Eu estava realizando meu maior sonho e me sentia totalmente infeliz,
porque minha preocupação era sempre o porquê eu estava tão à toa, o que eu
faria quando voltasse e o porquê eu já não tinha um estágio decente. Dei o
check da realização com gosto quando estava de frente para o campo de tulipas
em Keukenhof (sonhei tanto com esse dia), todavia eu estava morta por dentro e
não tive coragem de bater uma foto minha sequer. Minha cabeça girava. Foi aí
que notei que quando você atinge o ápice do seu potencial, fazer uma pausa é
algo que te deixa maluca, porque você se questiona se vai dar conta de tudo e
quando não dá, você se pressiona para que isso aconteça.
O meu cérebro viciou no acúmulo de
atividades, na sobrecarga de coisas para fazer, no excesso de informações. Não
tem como eu culpá-lo, pois esses foram os principais combustíveis que ele
recebeu desde que decidi acreditar mais em crenças limitantes do que investir
no meu autoconhecimento. Ser aceita passou de algo no qual eu almejava para uma
questão de necessidade, porque quanto eu você fazia, mais eu queria. Era
fazendo, agradando e se cobrando que eu acreditei encontrar o “caminho do
sucesso”. Os “sins” para o mundo, na verdade, eram “nãos” que eu dizia a mim
mesma, privando-me assim de ser feliz e de apreciar as pequenas conquistas. O
amor até chegou a bater na porta e eu a fechei com toda a força que eu tinha
por medo de ser “trouxa” demais. Quando ele parou de insistir, comecei a me
questionar se eu era mesmo uma pobre miserável, caindo na armadilha do
vitimismo e me perguntando se eu seria importante para alguém, seja no contexto
amoroso ou de amizades. Eu duvidava de tudo e todos e por mais que pessoas boas
tenham aparecido ao longo do processo, nem sempre elas conseguiriam ou conseguem
ficar, sobretudo quando paro de nutrir o seu lado do vínculo por motivos que
nem conseguirei citar apesar de querer.
Fora isso, os elogios insistem em entrar
por um ouvido e sair no outro, uma vez que as críticas são aquilo que acredito que
me fazem crescer. No fundo, noventa por cento delas me limitam e sei que preciso
impor limites antes que eu perca a cabeça. Não, peço por mais um pouco. É
sempre mais um pouco, afinal acho que sei a hora de fazer ou a hora que
precisarei filtrar. Não faço nenhuma das duas coisas. Sou viciada na aprovação,
no sentimento de querer ser a heroína na vida de todos, e também na crença de
que jamais serei lembrada caso não faça o que as pessoas querem. Sei que
ninguém está me conhecendo de verdade e tenho medo de onde posso parar ao tentar
encontrar uma fórmula mágica para aquilo que idealizo como sucesso. Isso tem se
tornado cada vez mais enraizado e cortar significa arrancar uma parte minha
fora. Uma parte na qual acredito que não posso viver sem.
Apesar disso e da dualidade interna que
carrego, o tempo foi passando e novas oportunidades surgiram. Pensei que isso
jamais aconteceria novamente, porque eu já tinha tido meus momentos de brilhar.
Quando as portas foram se abrindo, agradeci muito a vida por ter sido tão
gentil comigo e embarquei rumo ao caminho que trilhei nos últimos dois anos.
Não vou dizer que foi fácil, porque minhas inseguranças afloraram de jeitos
absurdos. Eu me senti sozinha em diversas situações. Questionei (e continuo
questionando) se meu diploma é realmente isso tudo que pregaram nos anos de
graduação. Duvidei do meu potencial diante de inúmeros desafios. Perguntei a
mim mesma se estava indo na direção que eu queria. Derramei lágrimas de maneira
intensa como se eu ainda fosse um bebê. Falei mais do que deveria com pessoas
não tão confiáveis. Contudo, não me veja como ingrata. Tenho muito orgulho de
onde estou e quero muito continuar o meu processo de desenvolvimento e de
autoconhecimento. Sinto que o fim não é esse ainda que os momentos difíceis estejam
presentes. Mas, eu preciso fazer uma pausa e entender que fracasso
não tem nada a ver com descanso ou momentos nos quais não sou tão produtiva.
No momento exato no qual escrevo, fui
obrigada a interromper as principais atividades que gostava de fazer por estar
totalmente exausta. Infelizmente acabei machucando algumas pessoas no
processo, pois não sabia a hora de admitir que não tinha como continuar.
Existem aquelas poucas pessoas que vão te entender e vão te acolher, só que
elas não vão te salvar. Você vai se salvar caso esteja disposta a impor os
limites que nunca teve coragem de impor ou de pedir a ajuda que nunca achou que
seria necessária. Não, eu não queria fazer isso. Não tive a intenção de
machucar ninguém. Não quero carregar nas costas mais uma culpa que pode
contribuir para a minha morte. Mas,
ainda assim, precisei colocar para fora antes que o próximo ponto de chegada
fosse o hospital. Por isso, comecei o texto dizendo que quase perdi o
controle total da minha vida. Foram meses intensos, onde evitei ver aquilo que
estava na minha cara. Eu sabia que estava ali e era só aceitar, era só pedir,
era só compartilhar. No entanto, não me sinto segura em fazer isso justamente
por conta da questão da aceitação. Posso ser compreensiva demais com as
pessoas, porém venho notando que, em oitenta e cinco por cento das vezes, sou
arrogante demais para permitir que alguém faça o mesmo por mim.
Tenho medo de perder algumas pessoas que
conheci no caminho, pois vocês não sabem o quanto elas significam para mim. Na
realidade, nem sei se elas sabem ou só já demonstrei isso em algum momento. Por
essa razão, quero entender isso como uma pequena pausa e não um adeus a tudo
que construí nos últimos anos. Não é uma derrota completa, mesmo que a vozinha
chata da minha cabeça continue me dizendo que eu deveria ter tentado mais, que
eu não me esforcei o suficiente ou que sou uma fracassada em tudo que me
proponho a fazer. Às vezes é difícil acreditar que uma fase ruim vai
desaparecer e que voltarei a apreciar a vida de alguma forma. Também é difícil
dar o braço a torcer e demonstrar vulnerabilidade, considerando que é uma
palavra que faz meu cérebro explodir na maioria das vezes.
Gostaria de explorar outras diversas maneiras
de ser eu mesma, todavia insisto em criar obstáculos que vão estar entre mim e
a minha felicidade. Posso citar aqui diversos exemplos, porém a extensão do texto
me preocupa e acredito não ser o momento. Então, quem sabe eu não volte a
escrever, não é mesmo? Quando comecei esse blog, eu tinha apenas treze anos e
hoje, aos vinte e cinco anos, confesso que não encontrei todas as respostas ou
a melhor forma de lidar com algumas coisas. Entretanto, aprendi que não tem
como eu explorar outras versões minhas sendo que nem sequer me conheço direito
e carrego comigo a sensação que todos ao meu redor me odeiam.
Dou trabalho demais. Sou dramática egoísta
demais. Reclamo demais. Eu me preocupo demais. Levo peso demais para qualquer
lugar que eu vá. Não sou boa demais para nada e nem para ninguém. Esses são
alguns pensamentos que me assombram. As cobranças para ser uma boa profissional,
uma boa filha, uma boa amiga, uma boa irmã, uma boa companheira, uma boa estudante.
Ou seja, uma boa em algo ainda mexe comigo. Acredite em mim quando digo que eu
quero entregar o meu melhor, só que não tem como eu fazer isso o tempo todo.
Não sei se estou disposta a continuar nesse ritmo a fim de perder a mim mesma (mais
ainda). Eu me questiono isso com frequência, mas ainda acho que preciso ser
a pessoa especial da vida de alguém, porque só assim acredito que vivenciarei
o que, de fato, é o verdadeiro sucesso. Talvez essa pessoa seja eu
mesma e são as fichas que ainda não caíram. Se um dia eu descobrir, volto
para contar (ou acabo de sumir de vez das redes sociais, me tornando apenas
uma lembrança e/ou um conceito na cabeça de quem já esbarrou comigo na vida em
algum momento). Por enquanto, eu vou parar para que os dois passos para
trás que estou dando agora sejam três ou quatro no futuro. Não é perda de tempo
hoje caso eu venha a me tornar um por cento melhor amanhã.
Ai, cara leitora e/ou caro leitor, acabo
de perceber que esse texto nunca foi para você e nem para te acolher. Peço
desculpas se você leu até aqui na esperança de encontrar alguém pudesse te
ajudar, porque, no fundo, deu para perceber que não estou ajudando nem a mim
mesma. São tantas camadas que me sinto inserida no duro inverno europeu, onde a
única solução para me aquecer é colocar trocentas mil peças de roupa enquanto não
chego em em casa e ligo o aquecedor (se é que tenho uma casa com aquecedor).
Contudo, se é que posso te dar um conselho (juro que já estamos no fim),
ele é bem simples na verdade: não se perca de si mesma(o) como aconteceu
comigo. Muito menos, ultrapasse um limite ainda mais crítico, sacrificando assim
quem é você e a sua essência por conta do que quer que seja.
(Emilly do futuro, esse conselho também é
para você, entendeu?)
Um beijo e até a próxima.
EEGR.
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